Um engenheiro da Vale, envolvido nas investigações sobre o rompimento da barragem de Brumadinho, teve negado o pedido de ressarcimento do valor pago pela contratação de advogado particular na esfera penal. A decisão é do juiz Mauro César Silva, titular da 1ª Vara do Trabalho de Nova Lima.
A barragem da Mina Córrego do Feijão, da Vale, rompeu no dia 25 de janeiro de 2019. Após o acidente, o engenheiro se viu envolvido em investigações do CREA-MG, polícias, Ministério Público, Assembleia Legislativa de MG e CPI do Senado Federal.
Na reclamação trabalhista, o profissional relatou que, apesar de a empresa ter contratado advogado com o objetivo de promover sua defesa e de outros empregados investigados, optou por contratar advogado de sua confiança. Para tanto, despendeu a grande quantia de R$ 1 milhão em 2020, o que, na visão do engenheiro, deve ser suportado pela empregadora.
Entretanto, após examinar as provas, o julgador não lhe deu razão. “A Ré não se descurou de seu dever de boa-fé, não agiu com abuso de poder e não se furtou de promover a melhor assistência jurídica ao reclamante”, concluiu na sentença, julgando improcedente o pedido.
Segundo apurado no processo, o autor teve a prisão decretada em 15/2/2019 e foi solto em 27/2/2019 após a impetração de habeas corpus pelo advogado contratado pela empresa. Voltou ao cárcere em 13/3/2019 e saiu em 14/3/2019. Os honorários do advogado foram custeados pela Vale.
Por entender que a defesa em conjunto poderia lhe ser prejudicial, o engenheiro alegou ter solicitado à Vale a substituição do advogado, o que, todavia, foi negado a ele. “Eu tenho direito a um advogado que não patrocine a causa de qualquer outro envolvido nesse imbróglio da barragem da Mina Córrego do Feijão, pois, a ser defendido em bloco, corro o risco de ser condenado”, argumentou na ação.
Em defesa, a Vale sustentou que, apesar de não estar obrigada a custear o assessoramento jurídico do autor, contratou renomado advogado, com vasto currículo acadêmico. Foi esse advogado quem obteve a soltura do autor e de outros dirigentes da empresa.
Na sentença, o juiz reconheceu a versão da empresa e ressaltou que o autor não defendeu uma tese, mas fez uma suposição de que a defesa conjunta lhe traria prejuízos. “Uma tese necessita ser demonstrada e pode ser confirmada ou negada, entretanto, seria impossível nesse caso extrair um resultado, posto tratar-se de situações excludentes: fica-se com o Advogado que já está a cuidar da causa, ou vai-se a outro.”, explicou, arrematando com o poema “Ou isto ou aquilo”, de Cecília Meirelles: “Ou se calça a luva e não se põe o anel, ou se põe o anel e não se calça a luva”.
Conforme ponderou o julgador, ambos os advogados contratados são dotados de notória especialização e afirmar que a defesa em conjunto poderia trazer prejuízo ao autor ou a qualquer deles é uma suposição carente de sustentação jurídica. Dizer que a tese defendida pela empresa “pode” incriminar outros colegas que estão sendo patrocinados pelo mesmo advogado significa suposição e não afirmação.
De acordo com o juiz, cabia ao advogado decidir quanto à estratégia da defesa. Se não houve recomendação de busca de um advogado para cada investigado, é porque o “expert da ciência penal” não viu validade dessa estratégia. “Um leigo na matéria penal não deveria se arvorar em fazer ilações desprovidas de fundamentos e desqualificar o trabalho do advogado”, registrou a respeito da conduta do engenheiro.
O autor ainda sustentou a necessidade de um advogado para si, porque a tese de defesa de um colega poderia lhe incriminar, ou vice-versa. “O autor não quer ser defendido pelo mesmo advogado que defende dirigentes da Vale, pois a atuação do profissional não seria isenta: pode ser necessário incriminar alguém ou alguém pode o incriminar”, destacou o juiz.
Mas, para o magistrado, o raciocínio conduz à presunção de má-fé, de irresponsabilidade profissional, incúria de um advogado, o que não se admite. “A hipótese de se esgrimir teses conflitantes desafia a lógica e o bom senso e flerta com a má-fé”, registrou na sentença.
Por tudo isso, o juiz concluiu que o autor não tem direito a ser ressarcido por ter escolhido outro advogado para tratar exclusivamente de sua defesa no processo que apura as responsabilidades sobre o rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho. O julgador, inclusive, chamou atenção para o fato de o engenheiro ter recebido o mesmo tratamento dado à sua chefia, a qual também foi incluída na defesa conjunta contratada pela Vale. O pedido do autor de ressarcimento da despesa pela contratação do advogado particular foi julgado improcedente.
O engenheiro foi condenado a pagar custas no valor de R$ 20 mil, calculadas sobre o valor da causa, de R$ 1 milhão. Os honorários advocatícios devidos aos advogados da Vale foram arbitrados em 5% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 791-A, parágrafo 2º, da CLT.
A decisão foi confirmada em grau de recurso: “A empresa prestou a assessoria jurídica ao reclamante, a mesma que concedeu aos seus superiores hierárquicos, inexistindo qualquer fato nos autos que comprove a alegação de que a banca de advogados escolhida pela Vale fosse, de alguma forma, prejudicar a defesa do reclamante”, constou do acórdão da 9ª Turma do TRT-MG. O processo foi remetido ao TST para exame do recurso de revista.